Uma casa pode-se transformar numa prisão. Sobretudo quando se é velho e se vive num andar alto de um prédio menos cuidado ou muito degradado. É o que acontece aos sete velhotes (seis mulheres e um homem) lisboetas que Marta Pessoa descobriu, filmou e ouviu longa e atentamente para o seu documentário Lisboa Domiciliária.
Por questões de saúde, não podem deixar as casas tão ou mais velhas do que eles, onde moram sozinhos e dependendo da ajuda amiga ou da assistência profissional de outros, ou acompanhados por familiares também já entrados nos anos e por gatos. Já enviuvaram, estão acamados, em cadeiras de rodas, apoiam-se em muletas ou andarilhos, ou então ainda conseguem mexer-se, mas pouco e com dores ou muita dificuldade, não o suficiente para descerem os lanços de escada que os separam da rua, do ar livre, da vida do bairro, do bulício da cidade.
Perante a câmara, recordam as vidas que viveram, falam do dia-a-dia e das maleitas, lamentam-se, recusam deixar-se ir, dialogam com as senhoras da assistência social, os médicos, as funcionárias do apoio domiciliário ou as vizinhas que os mantém limpos, alimentados, vivos e ligados ao mundo que passa lá em baixo. E que não voltarão a pisar. Lisboa é também a cidade destes prisioneiros das suas casas, e todo o mérito para Marta Pessoa por nos revelar que eles existem.
Sérgio Abranches . TimeOut
Sem comentários:
Enviar um comentário