terça-feira, 21 de setembro de 2010

PONTO DE PARTIDA PARA UMA REFLEXÃO

“As casas morrem de velhas, mas não morrem sozinhas. Nos prédios altos, por detrás das janelas, há um mundo dentro do mundo. São pessoas, idosos na maior parte, quase imóveis. Os corpos unem-se às casas e criam uma nova arquitectura. Para entrar neste universo é preciso mais do que passar a porta”.

É com este cartão de visita, em formato de sinopse, que a ainda jovem realizadora Marta Pessoa nos apresenta o seu mais recente filme. Aceitámos o convite e passámos para lá das portas abertas por Vera, Vasco, Arminda, Isabel, Maria Helena e Felicidade, uns entre os muitos homens e mulheres a quem a idade e a restringida mobilidade os confinam às paredes das suas casas.

Delicadamente sentados junto a estes seis anfitriões e a desafio de uma câmara estática e paciente por companhia, embarcamos ao longo de pouco mais de hora e meia numa narrativa de imagens e palavras pausadas que nos transportam a um mundo que sabemos existir, mas onde nem sempre queremos ou podemos entrar: o de uma geração que em tempos cuidou de nós e hoje precisa de ser cuidada, mimada, acolhida. Uma geração que atentamente escutou e cultivou os nossos sonhos de futuro a quem dois ou três minutos de revisitação do passado chegam para devolver ao rosto o sorriso fresco de outrora.

Apesar da limitação física, da fragilidade do corpo marcado pelo tempo, nem todos os protagonistas se abandonaram à deriva das suas vidas. Nesta viagem ao mundo real dos nossos dias, entre os que ainda podem, há os que se mantêm firmes ao leme das suas vidas, os que não perdem de vista o horizonte e os que teimam em ver sempre sempre mais além.

Não sendo um filme tecnicamente ágil nem narrativamente empolgante, “Lisboa Domiciliária” é, contudo, um documentário sério e credível, ponto de partida válido para uma reflexão sobre uma realidade social que nos aflige, apelando a um aprofundamento dos nossos valores e ao inequívoco empenhamento na nossa prática cristã.


Margarida Ataíde . Agência Eclesia

1 comentário:

  1. "Onde a vida insiste na sua riqueza e reclama um lugar para lá de estatísticas e vontades pias." É a minha parte favorita da sinopse e a parte que falta aqui. E onde está a magnífica crítica do Expresso, que toda a gente me telefona a comentar? Porque é que ainda não está neste Blog?
    Rita Palma

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